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imagem do Pedro Américo, o artista que virou pop star e cuja Batalha do Avaí quebrou recordes de visitação

Pedro Américo, o artista que virou pop star e cuja Batalha do Avaí quebrou recordes de visitação

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Por Letícia Lins

Dizia-me certa vez o Padre Antônio Vieira (1919-2003) – autor de “O jumento, nosso irmão” – que ao dar o Grito do Ipiranga, Dom Pedro I estaria montado em um jumento e não em um vistoso cavalo. Ele afirmava que, diferente do equino, um asinino muito utilizado à época por tropeiros, enfrentaria os acidentados caminhos de então com maior desenvoltura. Porém, no imaginário popular, o que fica é a ilustração imponente que consta em todos os livros de história e também em cerimônias oficiais, inclusive aquelas dedicadas a comemorar o Bicentenário da Independência, em 2022. Feche os olhos e pense sobre o assunto. O que vem à mente é o quadro “Independência ou Morte – O Grito do Ipiranga”, produzido em 1888 pelo pintor Pedro Américo. A obra é hoje a maior representação simbólica do ato que fez o Brasil deixar de ser colônia de Portugal.

O que pouca gente sabe é que Pedro Américo (1843-1905), grande artista que chegou a ser comparado a Miguel Ângelo e Rafael por críticos europeus, era – também – um verdadeiro pop star na Europa, cujo retrato “era visto em lojas, residências, cafés e restaurantes em Florença (onde residia)”. Por onde passava, as pessoas “o abraçavam e o aplaudiam” e “queriam conhecê-lo”. Na verdade, além de versátil – foi  também  caricaturista, arquiteto, filósofo, poeta, romancista, cientista, professor, político – Pedro Américo teve uma vida que daria um filme. Sua trajetória começou aos onze anos e ao longo da existência, conheceu o fundo do poço e a glória. A vida e obra dessa pessoa tão singular acabam de ser resgatadas no livro “Além do Ipiranga – A Extraordinária Vida de Pedro Américo”, do advogado e pesquisador Thélio Queiroz de Farias, que será lançado às 15 do sábado, na Feira Nordestina do Livro (Fenelivro), que acontece no Recife Antigo. A publicação resulta de parceria entre a Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) e a Editora União, da Paraíba, o que tem tudo a ver.

Afinal, foi naquele estado que Pedro Américo nasceu. Mais precisamente na cidade de Areia, situada a 123 quilômetros de João Pessoa, onde ainda criança chamava a atenção pelo primor dos seus desenhos. Aos onze, sua fama já corria por toda a Paraíba, quando foi visitado por uma missão científica chefiada pelo francês Louis Jacques Brunet, que leva o menino como desenhista por uma expedição que percorre vários estados do Sertão do Nordeste. Impressionado com o talento da criança, Brunet o recomenda ao Imperador Pedro II, que o convoca para estudar na Academia Imperial de Artes, no Rio de Janeiro. Assim, o garoto viaja aos doze anos, sozinho, para desenvolver suas aptidões. Aos 15, o menino solicita Bolsa ao Imperador para estudar na Europa, onde chega pela primeira vez aos 16 anos.

A partir daí, o artista se defronta com uma vida mágica e cheia de aventuras, marcada – também – por altos e baixos, que vão do reconhecimento a críticas de plágio motivadas por inveja ao seu talento. Viaja por vários países europeus, enfrenta a fome (quando perde o apoio imperial), quase foi atacado por um urso em um parque de Londres, sobreviveu a um naufrágio e chegou perto de ser devorado por um leão, na África.  Entre as aventuras não faltou nem mesmo uma viagem de balão. Em Paris, chegou a ser confundido com um malandro (em uma época de vacas magras) e foi até preso, no momento em que tentava vender medalhas que ganhara por seu trabalho.  Entre seus quadros épicos mais famosos constam, além da “Independência ou Morte” (1888), a “Batalha de Campo Grande” (1871) e a “Batalha do Avaí”,  este concluído em 1877 e que retrata um dos conflitos na Guerra da Tríplice Aliança. De dimensões gigantescas – 10m X 6m – “Batalha do Avaí”, pintado em Florença, teve repercussão “apoteótica”, como salienta o autor.  Com cerca de 400 figuras, o quadro recebeu a visita de 100 mil pessoas,  em apenas 18 dias de exposição na cidade italiana. Até então um público “nunca visto” em uma mostra de arte. Transportado para o Brasil em 1879, o quadro ficou em exposição (inaugurada por Dom Pedro II) em barracão, no Largo do Paço, onde recebe público ainda maior: 276.286 visitantes, fato também inédito no Brasil.

O pintor transformou-se em  um verdadeiro pop star de talento reconhecido em jornais do mundo. Além desses feitos, o paraibano teve outros fatos marcantes e pioneiros em sua vida:  foi o segundo brasileiro a obter título de doutor no exterior e o primeiro professor de arqueologia no país. Após quatro permanências na Europa, pretendia voltar ao Brasil, para se radicar no Pará, onde  iria chefiar o Instituto Pedro Américo, a futura Escola de Belas Artes, na qual os alunos estudariam Física, Química, História Natural aplicadas à Estética, ao Desenho à Pintura. O sonho de movimentar as artes na então exuberante e aristocrática Belém de tantos barões da  borracha naufragou, quando o artista morreu, em Florença, aos 62 anos. Revisitar a vida de Pedro Américo é vivenciar o orgulho do nosso talento e da história.

A leitura do livro de Thélio nos transporta à grandeza de nossos homens e nos conduz a uma “viagem” tão necessária quanto o repúdio  ao achincalhe  feito na festa do Bicentenário da Independência, no último 7 de setembro, por uma alma sebosa e pequena, que se autoproclamou na ocasião de “imbrochável”. Em um espetáculo grotesco e deplorável, para uma festa cívica. Felizmente, temos a grandeza de Pedro Américo para nos salvar da mediocridade em que alguns tentam transformar a nossa própria História. E fica  sugestão que, motivado pela surpreendente vida do artista, algum cineasta se interesse porque ela rende um filmaço. Já tivemos A Viagem de Pedro, Tiradentes, Getúlio, Carlota Joaquina, Xica Xavier, Independência ou Morte, Quilombo e tantos outros. Por que não Pedro Américo?

Serviço:
Evento: Lançamento do livro “Além do Ipiranga, a extrordinária vida de Pedro Américo e suas incríveis facetas”.
Onde: Na  Arena da Fenelivro, que acontece na Avenida Rio Branco (boulevard), no Recife Antigo
Quando: Sábado (24/09)
Horário: 15h
Preço do livro: R$ 90,00 (ainda não tem e-book) 

 

Fonte: Blog #OxeRecife (22/09/2022)

Foto: Quadro Batalha do Avaí (Divulgação)